sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Pobre metáfora


Desde que entrei na faculdade, eu ando de ônibus duas vezes por dia. Mesmo que eu trabalhe, não consigo juntar uma grana pra comprar um carro, ou uma moto que seja, pra me locomover sem gastar tanto, culpa dessa maldita compulsão por comprar coisas fúteis que fazem meus olhos brilharem (aqui, lê-se roupas, acessórios, maquiagens, sapatos, e qualquer coisa de mulherzinha). Mas sabe, mesmo gastando com a passagem, e me roendo de raiva por cada centavinho gasto indignamente com outras coisas, eu até gosto de andar sentada num banco de ônibus. Em geral, eu nunca fui de dirigir, sempre gostei mesmo é de ir no passageiro, prestar atenção na decoração das ruas, nas sacadas dos prédios, e claro, nas pessoas.

Tenho a "sorte" de morar na saída do município, assim, eu demoro meia hora pra chegar em qualquer lugar no centro. A faculdade é no centro, então, todo dia eu cruzo a cidade pra chegar lá. Bem no meio do caminho, tem o terminal de passageiros, onde ficam os funcionários da empresa que gerencia o transporte publico, cobradores, motoristas e afins. A maioria dos passageiros ficam por ali, esperando outros ônibus para outros cantos da cidade.

Eu gosto de sair um pouco mais cedo de casa só pra ficar ali um tempinho que seja. Observando. Um tipo de mania infame que muita gente chama de curiosidade, mas que eu gosto, desde sempre. Quando pequena eu sentava encostada na parede da sala de aula, pra ter uma visão geral da turma, e ficava horas a fio só olhando cada gesto de cada pessoinha dali, tentando desvendar quem ela realmente era e quem estava fingindo ser.

No terminal não é diferente. Eu tiro uma parte do meu dia só pra alimentar essa mania. Olhando o rapaz de vinte e tantos anos que quase sempre esta com fone de ouvido, all star e camisa xadrez, com um lápis rabiscando no caderno velho, com o olhar longe dali, é fácil saber que ele desenha, ou escreve, com certeza é artista, tem pinta de artista. Do outro lado aquela senhora, empurrando um carrinho de feira, de colete de lã e óculos fundo, eu gosto de pensar que ela tem zilhões de netos e que todos chegam pedindo chocolates aos domingos na casinha simples que ela deve ter. Apressada, a moça de batom vermelho sempre está olhando pro relógio, abotoando a camisa, e tentando ajeitar o coque, é certo que trabalha em escritório, aposto que tem um namorado, isso explicaria o corriqueiro atraso.

È estranho nunca saber se minhas tentativas de desvendar a vida de desconhecidos tem um bom resultado, saber se acerto pelo menos uma vez ou outra. Estranho e ao mesmo tempo instigante, na verdade acho que a melhor parte é essa: nunca ter certeza. As vezes tenho vontade de perguntar pra essa gente se eu tenho razão sobre elas. Mas sei lá, tenho a leve impressão que elas me achariam maluca.

No fim, a vida é meio isso. Um terminal de problemas e coisas desconhecidas que passam diariamente por você. Se a gente for curioso o suficiente pra desvendar todas as facetas dela, talvez valha a pena. Isso mesmo, talvez. E essa é grande graça da coisa, a gente nunca sabe o que vai acontecer.


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